Autosseguro com Prusik

Em meados de 2015, um interessante resgate foi realizado na qual um alpinista ficou preso no meio da descida de um rapel autosseguro com prusik. Muitos têm usado e ensinam estes sistemas, no entanto, este cenário foi incomum e apresenta-nos uma excelente oportunidade de aprendizagem.

Há muitas opções disponíveis para proteger uma pessoa ao rapelar por uma corda, no entanto os dois mais comumente ensinados e utilizados por praticantes de rapel recreativo são:

  1. Um cordelete curto preso à corda por cima do descensor e no ponto principal de fixação do cinto. Este nó blocante é geralmente um prusik 3-voltas ou um “Machard”.
  2. Um cordelete muito curto preso à corda abaixo do descensor e numa das cintas que partem abaixo do ponto principal. O nó blocante normalmente utilizado é um Machard.

Prusiks

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Como tantas técnicas no mundo da altura, se houvesse uma “melhor” técnica, então haveria apenas “uma” técnica. O fato de que há muitas opções ressalta que cada uma terá vantagens e desvantagens em situações particulares. Historicamente, suspeito que demorou um pouco para rapeleiros considerarem qualquer opção de autosseguro. A idéia, provavelmente, desenvolveu-se mais por acaso do que por design.

Prusik Acima do Descensor

Prusik-Above

Um método comum para ascender uma corda utiliza um cordelete curto e um comprido com ambos ligados separadamente à corda principal com um nó prusik. Normalmente o cordelete curto será da altura do punho até a axila (1,00 m) e o longo será do pé até o umbigo (1,20 m).

O cordelete curto é preso ao ponto principal do cinto e o longo, normalmente ligado à corda logo abaixo do cordelete prusik, paira livremente e fornece um ponto de apoio para o escalador para elevar-se com um pé.

Durante este impulso, o cordelete preso ao cinto torna-se frouxo e pode ser empurrado para cima proporcionando um novo ponto elevado, em que se pode descansar a carga na corda principal. Ao passar sua carga para o prusik do cinto, o cordelete longo do pé fica folgado e pode então ser empurrado para cima da corda, em prontidão para o próximo movimento para cima.

Alpinistas muitas vezes praticam mudanças entre subida e descida em uma corda livre e tipicamente percebem que não é necessário remover os prusiks para descer, desde que eles manejem com a mão que não freia e mantenham uma folga. Em algum momento as pessoas devem ter feito a conexão que ao ter pelo menos um prusik preso acima do descensor se alcançam dois pontos positivos:

  1. Uma fácil transição de descida para a subida.
  2. Um backup, ou autosseguro, que impeça uma descida descontrolada, em qualquer caso em que o controle da corda de freio fique perdido.

Em algum ponto no tempo, tornou-se comum para instrutores incentivar que seus alunos mantivessem um prusik autosseguro durante a atividade completa de subida/descida. Se um aluno comete um erro ao prender ou utilizar o seu descensor, a pior coisa que pode acontecer durante a transição de subida/descida é que eles acabem presos pelo nó prusik.

Um problema óbvio com a técnica é que ela tem uma predisposição de prender-se durante a descida. Uma vez bloqueado, o estudante deve ter um sistema para remover completamente a carga, a fim de desbloqueá-lo e retomar a descida. As duas opções mais comuns aqui são:

  1. Cordelete longo: coloque o cordelete longo com um prusik, pise nele e eleva-se o peso.
  2. Voltas no pé: levante ligeiramente uma perna, enrole a corda abaixo do freio em torno de um pé, traga a ponta para cima e agarre-a firmemente contra a corda acima do prusik bloqueado e, em seguida, levante-se.

Ambas as técnicas, especialmente a segunda, requer prática e competência antes de sair para o mundo real.

Têm ocorrido muitos casos em que as pessoas não conseguiram aplicar essas técnicas bem e acabaram ficando presas na corda com um prusik bloqueado acima do descensor. Também em cenários tais como salvamentos leves onde uma pessoa faz a frenagem com a carga de duas pessoas através de um descensor, será muito difícil de liberar um prusik acima deste dispositivo, utilizando estes métodos. Usar um cordelete com blocante abaixo do descensor apresenta um método autosseguro alternativo.

Prusik Abaixo do Descensor

Prusik-Below

Embora a sua origem não seja clara, uma nova técnica sugerida envolve a colocação de um cordelete muito curto com nó machard preso à corda abaixo do descensor e que deve ser ancorado em uma das cintas das pernas.

Uma consideração importante quando se utiliza este método é que o cordelete deve ser tão curto que ele nunca possa deslizar para cima e encostar no descensor. Se o blocante fica em contato com o dispositivo, então ele certamente não irá funcionar como um autosseguro, a menos que entre no dispositivo e fique travado.

Outros nós blocantes podem ser usados aqui, no entanto o Machard tem a vantagem de ser compacto e pode ser liberado sob carga. Basta colocar sua mão ao redor do blocante com carga e puxá-lo para baixo.

Deve ficar bem claro que os fabricantes de cintos não encorajam explicitamente esta técnica. No entanto, dado que este blocante só vai ter que aplicar uma tensão equivalente ao do freio de mão, é improvável que ele tenha que suportar mais de 0.2kN (cerca de 20 kg de massa estática).

As vantagens deste sistema incluem:

  1. Particularmente com o nó machard, é muito fácil para desbloquear. Só é preciso dar uns “solavancos” com a mão no nó e a descida pode ser retomada.
  2. Todo travamento do sistema de backup pode ser operado pela mesma mão de frenagem e com isso pode deixar a outra mão livre para afastar obstáculos ou assistir um paciente.
  3. Transições de borda não apresentam um risco para o nó blocante ou a mão que o manuseia (o que ocorreria se o blocante está acima do dispositivo).

 Discussão

Há certamente vantagens e desvantagens com ambos os sistemas. Tendo ensinado ambos desde o início de 1990, só recentemente fiquei ciente de um potencial problema.

Um alpinista experiente teve um incidente em que ele inadvertidamente amarrou o prusik acima do dispositivo e prendeu-o à cinta da perna. Eu nunca realmente considerei esse erro possível antes, mas certamente recomendaria que fosse apresentado em cada aula cobrindo autosseguros.

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O alpinista estava rapelando para acessar um ponto de escalada. Durante a sua descida o seu autosseguro travou e a situação resultante poderia facilmente ter sido fatal.

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Ao reconstruir este incidente para essas fotos é difícil enfatizar o quão desconfortável foi ficar nesta posição. Como o prusik tornou-se mais e mais bloqueado, ele puxou a cinta da perna mais e mais para cima. Eventualmente, com a cinta da perna acima da minha cabeça, pareceu lógico remover a perna da cinta para aumentar o conforto. O alpinista fez isso também. Uma vez que uma das pernas estava fora do cinto, fiquei numa posição ainda mais desconfortável e agindo com muito mais força agora no cinto que envolve a cintura. Se o descensor não for bloqueado em seguida, também criamos uma situação em que todo o peso está sendo apoiado por uma cinta de perna não certificada para cargas. Esta é uma situação que certamente não seria tolerado pelos fabricantes dos equipamentos.

O parceiro do escalador pediu ajuda a partir do topo da montanha e, felizmente, a assistência dos serviços de emergência locais foi ao mesmo tempo rápida e eficiente. O alpinista afirmou que ele ficou suspenso por pelo menos 90 minutos e provavelmente não teria permanecido consciente se ele tivesse permanecido nessa posição por muito mais tempo.

Este incidente em que se confundiram duas técnicas de autosseguro é uma experiência de aprendizagem extremamente valiosa. Agora que aconteceu pelo menos uma vez, é bastante previsível que isso possa acontecer novamente. Ao treinar outros ou estes métodos de autosseguro, esteja consciente do potencial de confusão. Acima de tudo, esteja preparado para uma variedade de cenários.

© Richard Delaney, RopeLab de 2015.  Translated by Eduardo José Slomp Aguiar, 2016.

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